Crônica:
Estômago
Tudo
o que fazemos acaba passando pelo estômago. Aquela sensação que alguns chamam
de borboletas no estômago, outros chamam de frio na barriga. O que realmente importa é que algo se passa
dentro da gente quando estamos nos relacionando com o mundo ao nosso
redor. Seja nos nossos relacionamentos,
sejam nas relações sociais, seja da forma que for. Algo mexe dentro da gente,
nos fazendo sentir confortáveis desconfortáveis ou indiferentes. Preocupo-me
mais com a última opção quando não mexe, não causa e nem deixa de causar,
apenas parece uma brisa.
Temos
que morder a vida conforme o que mexe dentro da gente, para isso é preciso nos deixar mexer. Ou
seja, hoje em dia fica meio complexo esse negócio de sentir as tais borboletas
no estômago o que dirá aquele friozinho
na barriga. Passamos o tempo inteiro nos comunicando através das
telinhas. Essas sensações do ”estômago”, surgem de forma natural e espontânea pela
cruza de olhares, sorrisos, conversas aleatórias e raramente irão surgir no mundo virtual.
Acabamos por perder esse instinto primitivo de nos deixarmos guiar pelas
sensações internas que o nosso corpo, mente e alma sinalizam ao nos relacionarmos com o outro. Afinal somos
uma troca infinita de energias, com isso elas conversam entre si o tempo todo, seja para coisas boas e nem tão
boas. Através dos nossos grupos pelo computador, celular, seja o meio for,
podemos até ter uma troca de energia a fim de ficarmos mais “perto” e até
podemos sentir algumas coisas. Nada é
tão poderoso e curativo quando uma velha conversa olhos nos olhos.
Quando
trocamos olhares deixamos que p outro; contemple os nossos detalhes, viaje nas
nossas nuances de voz, escorregue nas
nossas manias e se deixe levar pela espontaneidade do real. Daí acontecem cosias mágicas, delicadas e
sutis. Temos que agir pelo estômago,
aquela sensação particular de cada um é o que nos direcionará se é um tiro no
pé ou se ainda damos pé. Alguns chamam isso de instinto, outros chamam de
inato, outros chamam de vivência, gosto de chamar de estômago. Isso se liga também a uma das atividades que
mais temos prazer na vida que é comer e quase tudo o que fazemos passa pela nossa boca e acaba de
uma forma ou de outra sendo processada no nosso estômago. Palavras devem ser
digeridas assim como gestos atitudes nossas
e dos outros. Cuidado com o que você
sente pelo estômago porque às vezes aquela pessoa que lhe aciona uma simples
brisa, pode ser que não seja passageira, pode ser que ela venha desalinhar as
suas certezas a fim de que você amplie o seu repertório e comece a colorir a
existência de outra forma.
Se
fossemos mais receptivos em trocar olhares, em ter conversas de novas ou velhas botas e
deixarmos nos invadir pelo real, talvez tomássemos melhores escolhas. Quando deixamos as energias circularem
livremente dentro da gente sem usar muitos recursos tecnológicos que acabam por
atrapalhar e até mesmo dispersar esse processo, acabamos por perder
oportunidades únicas. Você pode me
perguntar se sou contra o mundo virtual, não desde que ele seja usado com
moderação e nele há recursos que driblam
um pouco a saudade e conectam de uma forma mais positiva. Minha melhor amiga
mora em São Paulo, nos falamos todos os
dias, uma troca de energias positivas constante que são regadas por mensagens
de voz. Essas tem o poder da gente se transportar para o lado da pessoa, sentir
que aquela distância construída pelas fronteiras fica um tanto menor, aliviando o vazio das mensagens
apenas escritas. Escrever é uma arte, se não seria escritora, mas se expressar
apenas digitando mensagens me deixaria uma pessoa mais fria e menos
humana. Precisamos urgentemente nos
deixar levar pelo nosso estômago a fim de que além do escrito, seja falado e até
mesmo gritado a fim de darmos vazão aos nossos sentimentos.
O mundo está carente de pessoas boas que
tenham a coragem de “quebrar as
barreiras “ do virtual a fim se ouvirem. O tom de voz, uma risada, um olhar
trocado e demais gestos, favorecem nos inundar pelos sentimentos que o outro provoca.
Vejo que as pessoas se defendem sem mesmo terem sido atacadas. Vejo pessoas
usando tantos mecanismos e tantos artifícios para escapar dos olhos nos
olhos, acredito que fujam delas mesmas.
Vejo tantas pessoas boas enlouquecendo pelo fato de não se enquadrarem no mundo
de hoje, ficamos carentes e sedentos de pessoas humanas. Vamos resgatar a “arte
do estômago”, levando nossos instintos para passear de vez em quando.
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