Relembrar, Recordar e Reclamar
Existe diferenças entre relembrar, recordar e
reclamar. Usamos estas ferramentas de uma forma tão
deliberada em nosso cotidiano que nem percebemos os reais significados e suas
importâncias. Será que são sinônimos ou será que são diferentes?
Quando relembramos,
estamos apenas travando um diálogo interno que tem a finalidade de manter o “ranço”.
Ou seja, relembrar é apenas uma forma de rechear o nosso mundo interno com uma
mesma canção. É como se tornar um disco
quebrado que fica apenas repetindo, sem desenvolver a capacidade de reflexão, evoluir e deixar fluir a energia.
Como ficar escutando uma mesma melodia de uma forma insistente que fica nos
alertando e nos fazendo reviver traumas, medos, nos faz visitar os fantasmas que
carregamos, faz que alimentemos os nossos monstros dentro do armário. Relembrar
é uma forma de ficar engordando os nossos próprios demônios, eles se abastecem
de culpa, remorso, memórias e tudo aquilo que deveríamos dar um destino, mas
apenas ficamos relembrando. Não adubamos com novas ideias, novos
projetos, novos planos e nem procuramos uma solução, ficamos apenas a espera que
um dia a gente pare de remoer os problemas e possa, de fato, organizar a nossa
bagunça interior. Girar sem sair do
lugar se deixando transbordar por angústias como afundar sem usar boias ou
remar em um barco a motor.
Recordar é retornar ao equilíbrio, colocar a ordem na
casa, arrumar as nossas bagunças, organizar as nossas gavetas e ser capaz de
fazer uma “ faxina na alma”. Poder agir
com o coração, se permitir sentir os
sentimentos, poder tomar um tempo para refletir e ser capaz de assumir as culpas. Aparar as arestas é poder ter a coragem de
recordar a fim de que possamos verdadeiramente nos transformar, evoluir, deixar fluir as nossas energias, para nos
tornar melhores. Recordar é possuir a
capacidade lembrar sem julgar, sem ser tomado por impulsividade,
raiva ou vontade de vingança. É quando conseguirmos admirar o caminho da nossa existência e nos debruçarmos sob as
partes que não saíram como gostaríamos e não sentir raiva disso. Poder recordar
sem julgar os momentos de tempestades,
as pessoas que nos frustraram e tantas outras coisas que poderiam ter dado
certo. Recordar é o primeiro passo para que a gente comece a repensar as nossas
atitudes, sem precisar revirar os sentimentos já tão revirados, sem precisar
remoer os remorsos, sem precisar recorrer aos impulsos, e principalmente, sem
precisar jogar a culpa no resto do mundo. Recordar é perceber que quando nos
despimos dos sentimentos ruins, quando somos capazes de reconhecer os nossos
defeitos, seremos capazes de refletir e de fato evoluir.
Há sempre tempo para se
libertar de nossas reclamações e de nossas memórias em formato de disco
arranhado. Enquanto estivermos abertos para à vida, há sempre tempo para passar a recordar e
começar de novo. Seja com um grande amor, seja numa conversa olhos nos olhos,
seja na companhia de um bom livro, seja numa velha canção, seja numa processo
de psicoterapia, seja meditando. Seja, da forma que for, todos nós podemos nos
libertar de nossos “ ranços”, de nossas amarras e passar a respirar. Até que possamos entender que não
existe liberdade maior do que recordar despido de julgamentos.
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