Relembrar, Recordar e Reclamar


                                                                     Relembrar, Recordar e  Reclamar


 Existe diferenças entre relembrar, recordar e reclamar.   Usamos estas ferramentas de uma forma tão deliberada em nosso cotidiano que nem percebemos os reais significados e suas importâncias. Será que são sinônimos ou será que são diferentes?


Quando relembramos, estamos apenas travando um diálogo interno que tem a finalidade de manter o “ranço”. Ou seja, relembrar é apenas uma forma de rechear o nosso mundo interno com uma mesma canção.  É como se tornar um disco quebrado que fica apenas repetindo, sem desenvolver a capacidade de  reflexão, evoluir e deixar fluir a energia. Como ficar escutando uma mesma melodia de uma forma insistente que fica nos alertando e nos fazendo reviver traumas, medos, nos faz visitar os fantasmas que carregamos, faz que alimentemos os nossos monstros dentro do armário. Relembrar é uma forma de ficar engordando os nossos próprios demônios, eles se abastecem de culpa, remorso, memórias e tudo aquilo que deveríamos dar um destino, mas apenas ficamos   relembrando.  Não adubamos com novas ideias, novos projetos, novos planos e nem procuramos uma solução, ficamos apenas a espera que um dia a gente pare de remoer os problemas e possa, de fato, organizar a nossa bagunça interior.  Girar sem sair do lugar se deixando transbordar por angústias como afundar sem usar boias ou remar em um barco a motor.


Podemos achar que a solução para organizar nossas bagunças e deixar as nossas malas abarrotadas de memórias um pouco mais leves, começar a reclamar. Sem perceber que isso é uma forma de se vitimizar.  Ao reclamar  damos um jeito de culpar o governo, o mau tempo, o trânsito caótico e transferimos tudo para o que acontece ao nosso redor. É mais prático apontar os defeitos dos outros do que  começar a agir com o nosso próprio nariz. Aquele velho ditado que cada um deveria cuidar dos seus macacos, se não a gente fica cuidando dos macacos alheios e acaba deixando de cuidar dos próprios.  Temos preguiça de assumir as nossas culpas uma preguiça medonha de mudar e o que dizer de sair da nossa zona de conforto.  Reclamar é o jeito mais rápido e mais prático para poder externar qualquer tipo de sentimento, hoje em dia com as redes sociais chovem reclamações a respeito de tudo o que se pode imaginar. Falta autoanálise, falta bom senso, falta empatia e principalmente, amor. Se tivéssemos mais amor por nós mesmos, seria tão mais leve começar a aceitar e amar os outros. Mas por falta de amor, acabamos por reclamar e verbalizar ou expressar de tantas maneiras distintas tudo o que pensamos que acabamos “vomitando” sentimentos ao invés de senti-los. Reclamar é a formais mais fácil  de aliviar os nossos descontentamentos, mas também a forma mais covarde, afinal transferimos a culpa  e não assumimos nada.



Recordar  é retornar ao equilíbrio, colocar a ordem na casa, arrumar as nossas bagunças, organizar as nossas gavetas e ser capaz de fazer uma “ faxina na alma”.   Poder agir com  o coração, se permitir sentir os sentimentos, poder tomar um tempo para refletir e ser capaz de assumir as culpas.  Aparar as arestas é poder ter a coragem de recordar a fim de que possamos verdadeiramente nos transformar, evoluir,  deixar fluir as nossas energias, para nos tornar melhores.  Recordar é possuir a capacidade lembrar  sem  julgar, sem ser tomado por impulsividade, raiva ou vontade de vingança. É quando conseguirmos admirar o caminho da  nossa existência e nos debruçarmos sob as partes que não saíram como gostaríamos e não sentir raiva disso. Poder recordar sem julgar os  momentos de tempestades, as pessoas que nos frustraram e tantas outras coisas que poderiam ter dado certo. Recordar é o primeiro passo para que a gente comece a repensar as nossas atitudes, sem precisar revirar os sentimentos já tão revirados, sem precisar remoer os remorsos, sem precisar recorrer aos impulsos, e principalmente, sem precisar jogar a culpa no resto do mundo. Recordar é perceber que quando nos despimos dos sentimentos ruins, quando somos capazes de reconhecer os nossos defeitos, seremos capazes de refletir e de fato evoluir.



Há sempre tempo para se libertar de nossas reclamações e de nossas memórias em formato de disco arranhado. Enquanto estivermos abertos para à  vida, há sempre tempo para passar a recordar e começar de novo. Seja com um grande amor, seja numa conversa olhos nos olhos, seja na companhia de um bom livro, seja numa velha canção, seja numa processo de psicoterapia, seja meditando. Seja, da forma que for, todos nós podemos nos libertar de nossos “ ranços”, de nossas amarras e passar a  respirar. Até que possamos entender que não existe liberdade maior do que recordar despido de julgamentos.

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