Encontro do Criador com a CriaturaMeu encontro com Humberto Gessinger
Eram meados dos anos 2000. A internet era discada. Os telefones
celulares raros e pesados. Para não
falar da música. Ela vinha em pequenos círculos metálicos, chamados CDs. Os tempos eram outros, mas curtia-se
a liberdade de não estar conectado. Sem precisar a todo instante atualizar
redes sociais, checar e-mails e outras “prioridades”. Estranho que a tecnologia
veio para facilitar, mas muitas vezes nos torna escravos.
Como era ser adolescente nos anos 2000? Tinha minha
própria de círculos metálicos. Separados por álbuns, gêneros e gostos. Músicas que
formavam minha identidade. Cantores que expressavam o que sentia. Dava colorido
ao meu mundo interno. E foi assim no auge dos meus quatorze anos, exprimia uma
paixão pelo rock brasileiro. Estava em uma época que adorava Os Paralamas
do Sucesso, comprei um coletânea dos seus maiores sucessos. A minha surpresa ao
chegar em casa dentro da sacola plástica estava algo desconhecido. A obra de uma band que para mim era totalmente estrangeira chamada Engenheiros
do Hawai. Fiquei frustrada, desapontada e realmente irritada com tal
contratempo.
Deixo o desconhecido
ali encima da estante. Olhando-me ali
estranho e ao mesmo tempo convidativo. Sem coragem de por as músicas para tocar
e nem ao menos me inteirar das letras. Foram
meses de estranhamento até que a curiosidade brotasse. Aos poucos fui me apropriando daquelas
canções. Versos em forma de poesia. Falam sobre a minha cidade Porto Alegre,
trazem também a cultura do Rio Grande do Sul.
Abordam o Brasil, a politica, as crises. Mas vai mais além, fala do ser
humano. Das nossas humanidades. Desuminidades. Sobre crescer. Se tornar alguém.
Identifiquei-me com as letras do Humberto, senti que finalmente havia encontrado
de fato alguém que me representava. Numa época tão confusa que é adolescência pudesse
me distanciar do bullying sofrido pela sociedade por sempre me sentir um peixe
fora da aquária. Por sempre querer discutir assuntos quem eram vistos como profundos
demais para alguém que recém estava crescendo. Nesta época já escrevia sobre a
corrupção que assola, o medo de paralisa e a total falta de bom sendo das
pessoas.
Encontrei ali um porto seguro. Uma inspiração para
escrever. Me tornar uma pessoa melhor. Depois de tantos anos, pude conhecer o
meu ídolo de perto. O encontro do criador e da criatura. Bebi as palavras proferidas por ele em sua
palestra. Ter a oportunidade de conhecer ele ao vivo foi um dos melhores
momentos da minha existência. Uma das raras vezes em que a gente se sente
pleno. Como se encontrasse alguém com o
qual pudesse finalmente ser eu mesma. Despida de vaidades. Rótulos. Máscaras. Já que hoje em dia é tão raro alguém
que fale sobre liberdade, inspiração, mudar o mundo a partir da gente mesmo. Valores
tão abatidos em uma sociedade abarrotada de informações, mas pobre em fazer de
fato.
Para finalizar fazendo uma analogia com as dez músicas
preferidas do Humberto:
Sempre irei surfar entre karmas e DNAs. Eterna Dom
Quixote que acredita ainda em mudar o mundo. Que amar seja sempre sem
medidas. E que seja por amor as batalhas perdidas. Prefiro andar só, vestida de mim mesma do que usar a cabeça dos outros como
degrau para chegar aonde preciso. Ainda acredito
que ninguém = ninguém apesar de
ainda sermos tão desiguais. Sempre estarei em busca de uma perfeita simetria, às vezes enlouquecedora a fim de sempre me
tornar uma carpinteira do meu próprio universo.
Um pouco princesa parabólica. De vez em quando esbarrar na minha própria timidez
tendo como pano de fundo um piano bar. Mas saber que toda a forma de poder é uma forma de morrer por nada. E que depois
de nós o mundo ainda continuará de uma forma ou de outra por isso é preciso
valorizar os ancestrais e também semear uma posteridade. Travarei a minha batalha pessoal e às vezes inglória
pela Revolta dos Dândis, me nego a
ser apenas mais uma na multidão. Ainda vejo diferença entre poder e corrupção. Enquanto
enxergar diferenças, não me contentarei.
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